quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O Juiz e a Criança Abandonada em Abrigo

O Juiz e a Criança Abandonada em Abrigo
Por Sávio Bittencourt

A Associação dos Magistrados Brasileiros lança em todo o Brasil a segunda fase da Campanha Nacional Mude um Destino, criada para incentivar as adoções legais e demonstrar a disposição do Poder Judiciário de dialogar com a sociedade brasileira sobre os preconceitos e mitos que envolvem o tema. É um momento histórico digno de nota: um gigante institucional desperta para a gravidade da situação de abandono de mais de oitenta mil crianças que vivem depositadas em instituições, sem que lhes seja garantido o direito constitucional de viver em família.
A Magistratura tem um papel extremamente importante na solução deste abandono histórico. É o Juiz de Direito que tem o poder-dever de dar solução definitiva e eficaz para cada criança que vive sem família. É este agente político do estado que tem em suas mãos a oportunidade de salvar um ser indefeso do abandono, da falta de auto-estima, da solidão. Transforma-se um homem comum, Juiz de Direito, servidor público, numa espécie de anjo: um toque de sua caneta pode transformar todo o sofrimento noutra realidade, tingindo uma vida em preto e branco em tons afetivos de boniteza.
Eu conheço Juízes realmente especiais. Longe da soberba e do comodismo, ganham consciência de seu papel revolucionário para a vida de gente inocente, partindo decididamente para o enfrentamento de sua missão, que não é fácil, mas precisa ser cumprida com coragem e determinação. Todavia, infelizmente, todos os que militam em favor do direito à convivência familiar têm conhecimento de atuações menos comprometidas de magistrados que não perceberam a importância de sua atuação para diminuir o impacto desta exclusão social. Alguns casos relatados, se verdadeiros, chegam às raias do absurdo e deveriam ser considerados pelos sistemas interno e externo de controle da magistratura.
Contudo o segredo judicial que envolve os processos nas Varas da Infância e Juventude tem servido mais para esconder realidades absurdas e atuações pouco louváveis do que para proteger a intimidade das pessoas envolvidas. Assim, casos que deveriam ser objeto de indignação pública e correição institucional ficam varridos para debaixo do tapete, causando uma situação aflitiva para a criança ou famílias, vítimas de uma decisão errônea que ficará covardemente acobertada pelo anonimato.
Destarte, é preciso afirmar que todo monopólio da informação sobre a criança é injusto, desleal, anti-democrático, abjeto e inconstitucional. Nenhuma instituição - nem mesmo a Magistratura - é proprietária das crianças abrigadas. Estas crianças, que muitas vezes são vistas como coisas, são sujeitos de direito privilegiados pela prioridade institucional. A informação sobre a criança institucionalizada precisa ser partilhada para que a sociedade possa exercer um controle democrático sobre os motivos, a duração de sua permanência no abrigo, seu tratamento enquanto abrigada e apresentar soluções criativas e afetivas para salvá-la do abandono.
O sentimento de milhares de pessoas que lutam, há mais de uma década, pela reintegração familiar, quando possível e recomendável para a criança, e pela adoção, como forma de família amorosa e perpetuamente acolhedora, é de grande expectativa: a esperança é que este movimento da AMB se aprofunde e se enraíze por toda a Magistratura nacional, sem ficar restrito apenas a sua vanguarda. Nossa crença é que cada Juiz precisa ter seu coração tocado por este urgência e se desembarace das teias de qualquer demagogia ou preconceito para dar à criança em tempo curtíssimo tempo uma solução para seu abandono em abrigo. Isto significa que o papel principal do Juiz de Direito da Infância e Juventude é garantir à criança o direito à família. É uma missão divina, majestosa, bela e necessária!

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