quinta-feira, 19 de junho de 2014

PREFERÊNCIAS PODEM DIFICULTAR A ADOÇÃO


Domingo, 15 de junho de 2014
BELÉM
Cleide Magalhães
Da Redação
ONG QUER ABRIR ESPAÇO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES FORA DO PERFIL DESEJADO
São comuns no Pará os casos de adoção em que os pretendentes já apresentam a criança, a chamada adoção consentida. Nestes casos, a mãe fecha acordo diretamente com o pretendente e disponibiliza a criança para adoção. Mas também se destacam aquelas situações em que os pretendentes - em sua maioria casais com nível superior completo - buscam a adoção de crianças e adolescentes dentro de um perfil preferido. Segundo Alessandro Ozanan, juiz de Direito da 1ª Vara da Infância e Juventude de Belém, do Tribunal de Justiça do Estado (TJE/PA), os perfis mais procurados hoje envolvem crianças de zero a dois anos, do sexo feminino e de cor branca até parda. Há menos procura por crianças acima de seis anos de idade, negras ou portadoras de necessidades especiais.
No último dia 5, havia, na Vara da Infância e Juventude de Belém, 15 crianças e adolescentes disponíveis para adoção sendo duas crianças com necessidades especiais e 13 adolescentes. “A maior dificuldade de se conseguir pais adotivos para crianças e adolescentes no Pará está na idealização ‘cultural do bebê’. Ainda hoje observamos essa ideia, que é ultrapassada, mas continua forte. Muitos não aceitam crianças acima de seis anos, por exemplo. É importante incentivarmos a adoção, mudarmos essa mentalidade. Esse preconceito é notado pelas crianças e adolescentes que são menos procurados, o que é triste, por¬que eles também têm o direito de viver em família. Uma das possibilidades de fazermos esse trabalho se dá por meio de iniciativa da sociedade civil, através do Grupo de Apoio à Adoção do Pará”, destaca o juiz.
Há nove anos, antes de adotar seu filho, hoje com 11 anos, a manicure Helena Carvalho, 50, e seu marido, o motorista Mário Carvalho, 56, procuraram a Organização Não Governamental (ONG) Renascer para ajudá-los no recebimento do menino.
“Ainda não temos filho biológico e, em princípio, queríamos uma filha adotiva, de até um ano de idade, mas a espera já levava um ano. Depois estendemos para que fosse um menino, até três anos, e em apenas três meses conseguimos. Toda minha família sabia que queríamos adotar uma criança e quando nosso filho chegou foi muito bem recebido por todos. Tratamos o assunto com transparência, ele sabe que foi gerado por outra mulher e encara bem a situação. Já me perguntou sobre sua mãe e falei que quando tiver maioridade pode procurar por ela. Isso fica a critério dele, não vou proibir jamais. Ele é meu filho, só Deus ou a Justiça podem tirar ele de mim. É um menino que nos dá muito orgulho, pois é inteligente, estudioso, carinhoso e vive dizendo que nos ama. Somos muito felizes. A participação na ONG Renascer, da qual até hoje fazemos parte, nos ajudou muito a receber nosso filho, porque conversamos e trocamos experiências sobre vários assuntos no grupo”, conta Helena, que mora no Marco.
“CONTE COMIGO” TENTA QUEBRAR PRECONCEITO
Uma das formas de o TJE/ PA aproximar a comunidade das crianças e adolescentes fora do perfil preferido a pretendentes à adoção que vivem no acolhimento institucional, se dá por meio do programa de apadrinhamento voluntário “Conte Comigo”. O programa foi lançado em 27 de abril deste ano, no anfiteatro da praça da República, em Belém. A meta é conseguir maior número de candidatos a se tornarem padrinhos e madrinhas.
O apadrinhamento, que pretende estabelecer uma corresponsabilidade social, por meio de compromisso voluntário, pode ser feito nas modalidades material, empresarial e/ou prestação de serviço voluntário, atendendo, assim, crianças e adolescentes de 0 a 18 anos. As que estão na faixa etária de 7 a 18 anos, quando a adoção se torna anda mais difícil, também poderão ser atendidas na modalidade afetiva.
As modalidades de apadrinhamento podem ser concomitantes dependendo da disponibilidade de cada padrinho ou madrinha e das necessidades das crianças e adolescentes, podendo inclusive uma criança ou adolescente ter mais de um padrinho ou madrinha. Em uma delas, a afetiva, o padrinho/madrinha dá atenção e carinho para uma criança ou um adolescente acolhidos em instituições, podendo levá-los para passar os finais de semana em sua casa, passear ou mesmo em férias. Também poderá orientá-los e preocupar-se com sua saúde, estudos e formação. Qualquer pessoa ou empresa idônea pode se tornar padrinho ou madrinha. Entretanto, para o apadrinhamento afetivo, é necessário preencher mais alguns requisitos.
EM MÉDIA, PROCESSO LEVA DE SEIS A OITO MESES PARA SER CONCLUÍDO
O juiz de Direito da 1ª Vara da Infância e Juventude de Belém explica que a pessoa que quer adotar uma criança ou adolescente deve contar com 18 anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes.
“A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais. O processo de adoção leva de seis a oito meses, em média. O que mais se deve levar em conta é o melhor interesse da criança e do adolescente. Depois que a criança ou adolescente é adotado, os pais de modo algum po¬dem devolvê-lo, pois a adoção é irrevogável e irretratável”.
SITE DISPONILIBIZA INFORMAÇÕES SOBRE PROGRAMA DE APADRINHAMENTO
Inicialmente, o programa inclui as Varas da Infância e Juventude e os Serviços de Acolhimento de Belém, Distrito de Icoaraci, Ananindeua e Marituba. Participam do programa o TJE/PA, através da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude, das Varas da Infância e Juventude de Belém, Ananindeua, Icoaraci e Marituba e da Escola Superior da Magistratura; Fundação Papa João XXIII (Funpapa), incluindo os Serviços de Acolhimento sob administração da Fundação, em Belém; Secretaria de Estado de Assistência Social, através do Espaço de Acolhimento Provisório Infantil (Eapi); Centro de Valorização da Criança “Raio de Luz” (CVC); Lar Acolhedor Tia Socorro; Abrigo Especial Calabriano; Creche Casa Lar Cordeirinhos de Deus; Serviços de Acolhimento de Ananindeua; Pró Vida - Sítio Girassol. O Programa ainda conta com o apoio da Escola Superior da Magistratura; Universidade da Amazônia (Unama); Grupo de Apoio à Adoção de Belém - Renascer; Defensoria Pública do Estado e Ministério Público do Estado.
Para conhecer melhor e obter mais informações sobre o programa de apadrinhamento voluntário “Conte Comigo”, acesse: http://www.tjpa.jus.
br/PortalExterno/imprensa/ noticias/Informes/1262-TJPA-lancara-programa-de-apadri¬nhamento.xhtml TEMA NÃO DEVE SER TABU EM CASA, MAS TRATADO DE FORMA NATURAL
Segundo Welligton Lima, presidente da ONG Renascer, que existe há 13 anos, ser pai por ado¬ção é o mesmo que ser biológico, mas existem algumas peculiaridades.
“A criança tem necessidade e vai querer saber sobre sua origem, como se deu seu nascimento. Na ONG realizamos oficinas e outros eventos para orientar os pais a lidar com isso, tendo a missão de quebrar preconceitos e tornar essa relação feliz. É preciso estar com o coração aberto para amar. E o amor chega de forma muito rápida e logo a criança está tão integrada à família. É fantástico e não tem diferença entre o amor de filho biológico e adotivo”, diz Lima, que é pai por adoção de um menino de 11 anos e biológico de uma menina de 9 anos.
O presidente da ONG orienta que é importante os pais prepararem o filho adotivo para enca-rar possíveis preconceitos que existem na sociedade. “O que cria os laços de amor é a disponibilidade, a atenção, o carinho, entre outros sentimentos. Quando os pais recebem uma criança com mais idade eles podem fazer o trabalho de desconstrução do que não os agrada e trabalhar na construção de um novo perfil de família, mas sem anular a história da criança para que esta veja isso não como algo que foi ruim, mas que proporcionou a chance de ter uma nova família e olhar para frente”.
Além disso, ele ressalta que é sempre bom manter a conversa sobre adoção em casa.
“Precisa ser um assunto sempre tratado de forma natural, porque quando as crianças e adoles¬centes forem questionados sobre isso vão ter segurança ao responder. Eles têm que ser preparados para não sofrer. Na ONG dizemos ‘meus filhos são adotados e em biológicos’. O termo significa dizer que todos os filhos precisam ser adotados afetivamente para se sentirem pertencidos à família”, explica Lima.
A ONG Renascer conta hoje com cerca de 30 casais, que se encontram para trocar experiências no Lar de Maria, em São Brás, sempre no último sábado do mês. Eles têm o apoio da assistente social Ana Mara, e outros profissionais que atuam voluntariamente.
A manicure Helena Carvalho, 50, recorreu à adoção para realizar o sonho de ser mãe e não se arrependeu. Ela garante que conversa com o filho sobre o processo. EVERALDONASCIMENTO/Amazônia (Imagem)
Wellington Lima, da ONG Renascer, aconselha os pais a falarem abertamente sobre a adoção
Amazônia Jornal


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