quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

FILHOS DO CORAÇÃO! MÃES DIVIDEM HISTÓRIAS EMOCIONANTES DE ADOÇÃO(reprodução)

04/01/2016
Postado por: O Editor
WAGNER, GRAZYELLE E GABRIEL, DE 6 ANOS Arquivo pessoal
A maternidade não depende de gestar e parir. Para tornar-se mãe, é preciso, acima de tudo, abrir o coração. E três mulheres do sul, sudeste e norte do Brasil provam isso com depoimentos sobre como formaram uma família. Veja, abaixo, três sinceros relatos de adoção.
Grazyelle Marques Clemente Yamuto, 35 anos, administradora. Mãe de Gabriel, 6 anos
Nós nos casamos cedo e, em 2002, depois de um ano, decidimos ter filhos. Aí descobrimos que não podíamos e foi aquele choque. Com isso, resolvemos pensar no caminho que seguiríamos. Acho que todo casal, em primeiro lugar, tenta inseminação, reprodução assistida. Mas na época não tínhamos dinheiro e fomos amadurecendo a ideia da adoção. Foi um processo que levou dois anos: pensamos muito e só quando decidimos é que fomos buscar informações.
Foi muito difícil porque não tinha quase nada disponível, nenhuma orientação, e eu não sabia nem como dar o primeiro passo. Foi aí que surgiu a ideia de fazer um site sobre isso para ajudar outros pais, o Adoção Brasil. Meu marido, Wagner, trabalha com informática e montou tudo.
Eu comecei ligando para um fórum, depois outro, até que uma moça me explicou que eu precisava ir ao fórum mais próximo da minha residência, que era o de Pinheiros, em São Paulo, procurar o setor de infância e juventude e pedir orientações ali.
Lá recebi uma lista de documentos necessários, que entreguei, e aguardei o contato deles para agendar uma entrevista com um psicólogo. Também passamos por um psiquiatra para recebermos um laudo de sanidade e nossos amigos escreveram um laudo de idoneidade.
Quando entregamos os documentos, já preenchemos o cadastro do perfil. E já tínhamos muito claro o que queríamos: sexo e cor eram indiferentes, mas fazíamos questão que tivesse até um ano de idade.
Entre a entrega da documentação e a entrevista com o psicólogo se passaram quatro meses. Conversamos com o profissional durante quase duas horas. Ele quis saber sobre nós, nossa família, por que decidimos adotar, o que esperávamos da adoção, o por quê da escolha do perfil, se tínhamos apego à nossa família e se contaríamos para o nosso filho que ele era adotado. Foi uma conversa bem bacana e fomos aprovados, mas sabemos de casos em que o casal é reprovado por ainda não estar preparado para a adoção.
Três meses depois, fizemos uma entrevista com uma assistente social, também no fórum, em que ela quis saber sobre a nossa estrutura financeira, nossa profissão, e agendamos uma visita dela em nossa casa. Duas semanas depois ela foi até lá, e só depois disso entramos na fila da adoção.
Depois de quase dez meses esperando por esse momento, ainda passamos três anos e 9 meses na fila. E a cada dois anos é necessário renovar o processo, passar pelas entrevistas novamente. Essa espera foi tranquila porque tínhamos 26 anos na época, éramos jovens e não estávamos com pressa. Mas eu optei por não deixar o quarto pronto porque eu achava que ia ser muito sofrimento abrir a porta, ver tudo montado e não ter o principal. E estávamos ansiosos porque queríamos o nosso filho. Às vezes a gente ficava bastante triste, chorava, mas sempre decidia seguir em frente e não desistir do nosso sonho.
Só quando o nosso processo estava para vencer pela segunda vez recebemos a ligação da assistência social. Nos contaram a história do Gabriel, que ele saiu da maternidade direto para o abrigo, e perguntaram se nós tínhamos interesse em conhecê-lo. Ao telefone, eu falava “é sério mesmo? É verdade?”. Não acreditava que estava finalmente acontecendo, e já queria vê-lo no dia seguinte.
A assistente social me falou para ter calma porque essa fase também tem etapas. Primeiro a gente foi ao fórum e ela mostrou fotos do Gabriel para respondermos se queríamos ou não. E foi aquela ansiedade porque calhou de ser Carnaval e o fórum parou por uns dias. Àquela altura já sabíamos o nome dele, sabíamos que estava com quase 10 meses, e ficávamos imaginando como será que ele era.
Mais ou menos uma semana depois que falamos sim para o Gabriel, o juiz deu uma autorização para visitá-lo no abrigo. Quando ela me ligou e falou que o documento estava pronto era início da tarde. Eu corri para o fórum, peguei a autorização e fui correndo para o abrigo, tudo no mesmo dia, e naquela ansiedade. No caminho eu falava “filho, calma que a mamãe tá chegando”.
Quando nós chegamos lá, Gabriel estava dormindo como um anjinho. A assistente social do abrigo nos recebeu, falou sobre ele, contou que engatinhava, que já podia comer. Explicou a rotina do abrigo que nós teríamos que respeitar e que passaria para o fórum um relatório sobre nossas visitas.
Fomos até lá todos os dias. Nossos trabalhos foram bem bacanas porque entenderam esse momento e nos liberaram durante o dia. Então, eu conseguia passar bastante tempo com ele. E na hora de ir embora dava aquela tristeza, né? No quarto dia ele já nos conhecia, ficava olhando… Fazia aquela carinha que partia o coração.
Eu chorei quase todos os dias enquanto voltava para casa, porque queria trazê-lo e não podia. Mas faz parte do processo ter esse convívio. Ficamos 23 dias visitando o Gabriel no abrigo até o juiz expedir a guarda provisória.
Quando a assistente social ligou avisando que o documento estava pronto foi o dia mais feliz. Saímos correndo para o fórum e eu liguei para o abrigo e falei: “é hoje o dia que o Gá vai para casa”. Eu nunca me esqueço, era uma quinta-feira, dia 10 de março.
Ficamos um ano e meio com a guarda dele até sair a sentença da adoção. Aí sim pudemos alterar a certidão de nascimento dele.
No dia em que Gabriel chegou, toda a família foi lá para casa, pois estavam todos ansiosos para conhecê-lo. E dez dias depois já foi aniversário dele, então fizemos uma festa, nossos amigos foram conhecer, foi aquela pegação, de colo em colo. Ele foi muito bem recebido por todos e com muito amor.
Na primeira noite do Gabriel em casa eu não dormi. Ficava olhando para ele e falando: “ele está em casa”. Eu olhava e não acreditava que ele estava aqui mesmo, que era ele. Eu via aquele anjinho dormindo e falava “é meu, eu amo”. Já era a pessoa mais importante da nossa vida.
Eu comecei a me sentir mãe dele quando olhei a foto pela primeira fez. Eu já me senti mãe quando recebi aquele primeiro telefonema, mas acho que a ficha só caiu mesmo nesse momento da foto.
Quando ele chegou em casa ficou olhando todos os detalhes, engatinhou pela casa toda e quis explorar tudo. A adaptação foi super tranquila, acho que tanto para nós quanto para ele. Eu acabei pedindo demissão do meu emprego porque sempre falava que quando nosso filho chegasse queria passar um ano com ele.
Hoje Gabriel tem 6 anos. Ele sabe que é adotado e a gente procura tratar o assunto da forma mais natural possível.
Acho que a melhor maneira de falar é contar histórias de forma lúdica. Nesse meio tempo eu tive sobrinhos e o Gabriel viu minha cunhada grávida. Aí vinha aquela curiosidade, e eu falava que ele nasceu do coração da mamãe, que o Papai do Céu plantou a sementinha na barriga de outra moça e depois o mandou para a mamãe e para o papai.
Eu acho que tem que responder o que a criança pergunta, não precisa se estender no assunto, é só tratar tudo de maneira natural.
A gente explica “filho, você foi muito esperado, papai e mamãe já te amavam desde sempre”. Acho que isso faz com que ele cresça vendo a adoção com naturalidade, e se um dia ele tiver curiosidade de se aprofundar, acho que é a história dele e nós não temos o direito de apagar nem de esconder. Então, se ele quiser procurar, vai ter nosso apoio.
CRISTIANE AO LADO DO MARIDO E DOS FILHOS Arquivo pessoal
Cristiane Zemuner Guimarães, 42, tabeliã. Mãe de Matheus, 9 anos, Lucas, 7 anos, e de uma menina de 6 anos
Sempre pensei em adoção. Antes de casar eu já tinha esse desejo. Quando eu e Samuel nos casamos queríamos ter um filho biológico e um adotivo. Mas, quando nasceu o Matheus, naquela hora eu quis ter outro. Aí, quando nasceu o Lucas, a gente decidiu adotar o terceiro. E a gente gostaria que fosse menina.
Entramos com o processo em fevereiro de 2013 e em agosto fomos habilitados. Queríamos uma menina de até 7 anos, podendo ter doenças tratáveis. Esperamos durante dois anos, e ao longo de todo esse tempo procurei em todas as comarcas do país. No dia 4 de agosto a vara entrou em contato comigo dizendo que nós éramos os próximos da fila. Aí, entramos em um processo de aproximação, fizemos várias reuniões, até que, no dia 25 de setembro, a gente a conheceu pessoalmente.
A gente sempre sabe que tem bastante criança esperando, que o abrigo tem bastante bebê e que tem criança que passa anos esperando pela adoção. Mas o processo judiciário é lento. E essa espera, para os pais, é angustiante. Você não sabe onde está sua filha, o que está acontecendo com ela. Eu imaginava que já poderia ter nascido, ficava naquela ansiedade, sabendo que as crianças estão à espera de uma família. No primeiro ano aguardando, eu sabia que ia demorar se eu quisesse uma criança menor. Então passei esse período bem tranquila. Mas no segundo ano comecei a procurar por contra própria. Todos os dias ligava para alguma vara, ia aos grupos, mas nunca encontrei.
Desde o começo preparei os meninos: eles participaram das reuniões na vara e a gente comentava que logo ia vir uma irmãzinha. Começamos a prepara-los para dividir as coisas, para a aparência dela. Se a gente via uma criança negra, falava “pode ser assim”, e se via uma criança branca, falava “pode ser assim”. Mostrava que qualquer uma daquelas crianças poderia ser a irmã deles.
Nos últimos seis meses eles começaram a ficar ansiosos também, e sofreram essa angústia da espera. São crianças, então nem sempre entendem.
No abrigo, primeiro ela recebeu uma mensagem de voz nossa. Os meninos disseram “a gente te ama muito, queremos muito ter você aqui em casa, esperamos muito por você, vamos brincar bastante”.
Depois recebemos uma foto dela, mandamos uma cartinha e ela mandou para a gente uma carta e uma mensagem de voz. Aí viu nossa foto.
Foram seis meses fazendo terapia e sendo preparada pelo pessoal da vara da infância e da juventude e do abrigo. Só no último mês nos apresentaram por fotos: essa é a sua família, esses são seus irmãos, sua casa é assim.
Então ela foi, aos poucos, entendendo qual era a família dela. E ela queria ter uma família. Pedia para conhecer a mãe e os irmãos. Pouco a pouco esse amor foi sendo gerado, e isso é uma coisa que requer tempo, é preciso alimentar a ideia no cérebro e no coração.
Ela veio já de braços abertos. Nos conhecemos numa manhã, e à tarde aconteceu o encontro dela com os irmãos. Quando os meninos chegaram os três se abraçaram, e eles estavam muito ansiosos. Meu filho mais velho até dava pulinhos. Quando saímos do abrigo ele falou “mãe, a gente conheceu a irmãzinha!”.
A adaptação dela em casa está indo muito bem. Ela aprende muito rápido. A criança de abrigo não tem ninguém que eduque, que abrace quando chora, e por isso esse processo foi necessário. Ainda ficamos 30 dias com ela no abrigo porque lá era o lugar que ela se sentia segura. E a mudança foi aos poucos. Primeiro foi conhecer nossa casa. Depois dormia lá dia sim, dia não. Aí já foi entendendo a rotina da casa.
Ela aceita muito bem os ensinamentos, aprendeu o por favor, o obrigado. E já entendeu que é filha. Então, assim como os irmãos, solicita o espaço dela, disputa os pais, como se os três estivessem desde bebês juntos.
Ela sempre foi muito carinhosa, gosta de colo, de abraço, e desde o começo já me pegou pela mão, quis mostrar o quarto dela no abrigo, me disse “mamãe, você é linda! Mamãe, você parece comigo”. Mesmo assim, no começo, a gente evitava tocá-la muito para não interferir na privacidade dela, e pedia se podia beijar e abraçar. Hoje ela beija, abraça e fala “mamãe, hoje eu vou dormir agarradinha com você”.
Ela morava num abrigo com 30, 40 crianças, e não tinha alguém sempre ali com ela. Então grudou em mim. Nos primeiros 15 dias mal olhava para os irmãos, era só eu. E aquele vínculo materno precisou ser gerado. Eu dediquei tempo para ela, investi nesse vínculo, e a gente percebe que ela tinha essa necessidade de entender que agora tem mãe, agora tem pai. Isso foi muito importante nos primeiros dias. E hoje eu digo que tenho um chicletinho.
No abrigo eles fazem tudo sozinhos, mas em casa ela gosta que a gente faça tudo juntas: ir ao banheiro, pentear o cabelo. A família afetiva tem que saber disso, que vai precisar estar disponível emocionalmente, fisicamente. É como um bebê quando nasce, você precisa ficar 24 horas à disposição. Com o filho adotivo é a mesma coisa, só a forma de gestação que é diferente.
Quando eu saio digo que vou, mas eu volto, e explico que a mamãe é para sempre, que o papai é para sempre. Esse para sempre tem que ficar. Ela viu no abrigo crianças serem devolvidas, então a gente tem que dar essa segurança para ela.
Com cada filho que eu tenho aprendo mais. Se eu tiver mais um vou estar mais madura, porque a criança gera isso no adulto. Cada uma é de um jeito e isso faz com que você cresça, amadureça.
A maioria dos adotantes prefere um bebê, mas a minha filha é um bebê. Com essa experiência a gente muda a nossa ideia sobre infância. E todos precisam de uma família. A família é a base da sociedade, da pessoa. Qualquer vínculo é necessário para a criança desenvolver uma personalidade, um caráter.
Não há necessidade de haver um laço de sangue. É um laço de amor, de ter uma posição, de querer amar. Isso de que você ama seu filho porque é seu filho cai por terra. Por exemplo, eu não sei a cor do sangue dele, não importa se o nariz dele é fino ou se é gordinho. É o Matheus, eu amo o Matheus. Ou, quando você casa, não pergunta o tipo sanguíneo do seu marido. Você não olha a ficha policial do seu pai. O amor não depende disso.
Não é a idade em que a criança é adotada, ou a família de origem, ou o sangue, mas o amor que ela recebe que determina se vai ser uma boa pessoa.
ELIMEIRI, WILLIAM E OS FILHOS Arquivo pessoal
Elimeiri Tomazeti, 35, bancária, e William Luis Mattoso, 42, militar. Pais de S., 10 anos, e Julia, 2 anos
A adoção, para mim, sempre foi algo desejado. Desde criança eu falava que ia adotar uma criança. Não sei de onde essa vontade surgiu. Quando eu conheci meu marido, ele passou a desejar junto comigo. Na família dele existem vários casos de adoção, de tios e primos, então quando falei sobre isso ele tratou o assunto com muita naturalidade. Casamos e nem cogitamos ter filhos biológicos. Três anos depois, decidimos que era a hora da adoção.
Nossos filhos não são irmãos biológicos, são afetivos. Primeiro veio o S., com 7 anos e 10 meses. O processo dele foi e ainda é um pouquinho demorado, e hoje os pais biológicos têm poder familiar suspenso.
Nós passamos um bom tempo nos conhecendo, ele é de outro estado e nós viajávamos para lá ou usávamos o Skype.
Com a Julia foi mais tranquilo, ela chegou também de outro estado com um ano e três meses. Ela tinha má formação e nasceu com sífilis, e por não acharem pais que a aceitassem foi para fora do estado dela.
A adoção dela foi muito fácil, já era destituída quando começamos, então o processo já foi finalizado e temos a certidão de nascimento dela no nosso nome. Já a do S., não. Ele foi destituído no finalzinho de fevereiro, mas os genitores recorreram e o processo foi para segunda instância para que ele de fato seja nosso no papel.
Nenhum dos dois tem contato com os pais biológicos. Quando o processo está em andamento, o poder dos pais fica suspenso. O S. tem mais três irmãos biológicos menores do que ele, que foram adotados um ano antes, e todos têm contato uns com os outros. Assim que possível a gente reúne a galerinha para se manterem próximos, até para que possam procurar os pais mais tarde, caso queiram. A gente conversa com ele sobre a adoção e nunca escondeu isso. Se, quando meus filhos tiverem mais idade, quiserem procurar os pais biológicos, desde que a gente vá junto, tudo bem.
Quando o S. chegou a gente passou de um casal sem filho para um casal com um menino de 7 anos. Acho que isso foi mais trabalhoso para mim, porque tivemos aquelas questões de agressividade, dele não me aceitar como mãe, de falar que eu não sou a mãe dele. Então tivemos que tratar do passado, resolver as questões que ele trouxe, principalmente a violência, e isso levou uns cinco meses.
Desde as primeiras semanas S. aceitou o pai. Comigo teve mais atrito, talvez porque ele teve uma outra referência feminina, que era a mãe biológica. Talvez, na cabeça dele, me aceitar significasse trair a mãe biológica, então quando ele entendeu que não estava substituindo, mas ganhando mais uma mãe, começou a suavizar e foi me aceitando.
Antes de adotá-lo fizemos um curso de um mês, duas vezes por semana, bastante teórico. Lá, vimos depoimentos de pais de crianças adotadas e eles relataram todas essas coisas. Saíamos das aulas boquiabertos.
Depois da chegada do S. passamos pelas mesmas dificuldades e ficamos assustados também. No começo a criança faz muita coisa para nos testar, vive aquela contradição de aceitar uma nova mãe. A criança mais velha traz muita bagagem, vem com uma história de vida que às vezes a gente, mesmo adulto, não conhece. O S. veio de violências muito grandes. Ele me falava: “eu vou pegar uma faca e enfiar no teu bucho”. Muitas vezes as pessoas questionavam se eu não tinha medo que ele me matasse.
Nas crises e surtos que o S. tinha ele me batia, me machucava. E quando você adota uma criança mais velha que passa por essa fase, tem que saber que ela não faz isso por maldade, mas por instinto. Leva um tempo até você ensinar que não é assim, explicar o que acontece se ele enfiar a faca no bucho de alguém, o que ele vai se tornar, se é isso que ele quer para a vida dele. Tem que trabalhar todas essas questões que eles trazem.
O S. perguntava: “O pai fala que ama a mãe, mas o pai não bate na mãe. Como que é isso?”. E a gente explicava que na família a gente demonstra amor com beijo, com abraço.
Tivemos muito apoio psicológico, tanto para ele quanto para nós, para superar tudo isso. Tem dias que você não dá conta e precisa que alguém te fale: chora mesmo, desabafa.
Hoje nossa relação é normal, de mãe e filho. A gente briga, ama, põe de castigo.
Nossa ideia sempre foi ter dois filhos, e o S. fez questão que o segundo fosse uma menina e que viesse pequena. Ele queria ser o irmão mais velho. Então trabalhamos o que ele queria e o que nós desejávamos, porque ele também é parte da família.
No início rolou ciúme. Ele falava: “vai lá, devolve ela, pega uma maior”, porque ele viu que irmão mais novo requer muito mais atenção. Mas hoje os dois são um grude, se um está fazendo arte, o outro está junto. A união deles, o sentimento de irmãos, é muito gostoso de acompanhar. Até as travessuras ele fazem juntos.
Hoje, eu e William raramente saímos sozinhos. Levamos os dois para onde vamos, e atuamos na questão da adoção de animais, então tentamos levá-los sempre conosco para que entrem em contato com a solidariedade aos animais abandonados. Eles estão 100% nas nossas atividades.
A gente pensa em adotar mais um. Eu penso que podemos fazer isso daqui cinco anos, o William acha melhor esperar oito. A gente imagina um adolescente, ou uma adolescente, acima de 13 anos, porque daqui a uns anos eu já vou ter mais de 40 anos, não vou ter mais emocional nem físico para acompanhar um bebê. Até por isso a gente conversa para que nossos filhos tenha a maturidade de nos ajudar quando chegar mais um, durante a adaptação.
Criamos um grupo de apoio a adoção chamado Amor Incondicional, para incentivar outros casais a optarem por adoção tardia, ou de crianças especiais. Tem gente que acha que uma adoção tardia não vai ser tão gostosa quanto adotar um bebê, então eu converso muito com outros pais. Primeiro, eu não minto. Falo todos os obstáculos que eles vão encontrar, explico que a criança mais velha traz muita bagagem e muitas vezes a gente se pergunta se está fazendo o certo e se vai dar conta. Crianças que sofreram abuso sexual às vezes tem uma sexualidade mais aflorada, aí você tem que explicar que não é certo fazer essas coisas com o próprio pai e aos poucos construir essa ideia. Tem mãe que não tem maturidade para isso. Então a adoção especial, tardia, entre irmãos, é muito mais trabalhosa. Mas é muito mais satisfatória porque você vê a trajetória da criança. É recompensatório.
O S., com oito anos, só conhecia as vogais e contava até cinco. Depois de seis meses ele já estava lendo as primeiras frases. Ele tem Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade e Distúrbio de Processamento Auditivo Central, e hoje está 100% alfabetizado. Ele lê, escreve, faz contas simples. Parece pouco para uma criança de dez anos? Talvez seja. Mas para uma criança com a história dele, que teve que se adaptar a uma nova família, a uma nova cidade, a uma nova vida, superar os distúrbios para aprender a ler é uma grande vitória.

Original disponível em: http://www.pegueido.com.br/filhos-do-coracao-maes-dividem-historias-emocionantes-de-adocao/

Reproduzido por:  Lucas H.


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