segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Pedofilia não é arte (Reprodução)

08.10.2017

Opinião / RODRIGUES SOUZA

Nas últimas semanas, o país tem se debruçado sobre as exposições artísticas mostra QueerMuseu em Porto Alegre, assim como a performance do artista Wagner Schwartz durante a abertura do 35º Panorama de Arte Brasileira, que incluía interação dele desnudo com o público presente.

Diversas reflexões foram produzidas para contribuir com os debates, muitas delas empobrecidas de contextualidades críticas e analíticas, que minimamente, não fundamentam, muitos menos distinguem as diferenças, assim como as dimensões do nú artístico (exposição do corpo de uma pessoa nua em diversos meios artísticos, como pintura, escultura, performance, entre outros), da erotização (transformação de um assunto ou atividade normalmente desprovida de carga erótica em fonte de prazer sexual)  e da pedofilia (perversão que leva um indivíduo adulto a se sentir sexualmente atraído por crianças).

Na sociedade, há uma tendência (agir de certa forma) com o passar dos anos, a produzir-se referenciais, quando os que estão postos já não produzem os efeitos desejados, para legitimar discrepâncias sociais e demarcadores de diferenças entre os povos, tendo por consequências os preconceitos e as discriminações.

A tendência atual, ou melhor, a “bucha de canhão” da vez, são as crianças e os adolescentes.

"O manto sacral da proteção social que recai sobre essas pessoas tuteladas, devido a sua incapacidade jurídica, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, é o subterfúgio utilizado para substanciar e fomentar os discursos conservadores"


O manto sacral da proteção social que recai sobre essas pessoas tuteladas, devido a sua incapacidade jurídica, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, é o subterfúgio utilizado para substanciar e fomentar os discursos conservadores.

Pois bem, em um país onde quase 6 milhões de crianças vivem em extrema pobreza, onde 23 mil crianças ainda vivem nas ruas, onde cerca de 8 milhões de crianças são abandonadas.

Será que realmente, e de fato esses discursos eivados de falsos moralismos estão preocupados com a defesa dessa parcela social, conforme preconiza o ECA e tantos tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário?

Além deste, apontamos outras indagações que nos possibilitarão verificar se realmente esses “defensores da moral e dos bons costumes”, estão de fato preocupados com as nossas crianças e adolescentes:

1 - Por que não problematizar a pedofilia na família (levando-se em consideração as suas extensões)? Será que é um tabu?

2 – Por que não problematizar a exploração sexual de menores em idade, muita das vezes com consentimento dos próprios pais para manutenção econômica dos lares?

3 – Por que não problematizar a degradação humana de crianças e adolescentes que vivem em situação de rua?

4 – Por que não problematizar as formas de abandono (da intelectualidade a lata de lixo) infantil no país, assim como a formatação jurídica do sistema de adoção?

5 – Por que não problematizar as práticas pedófilas praticadas por padres, pastores e outros membros religiosos, que, quando vem a público, são acobertados pelo corporativismo presentes nestas instituições?

6 – Por que não problematizar o tráfico de crianças e adolescentes para fins de remoção de órgãos, exploração sexual, adoção ilegal e outras práticas horrendas?

7 – Por que não problematizar a falta de políticas de Estado, assim como a omissão deste frente a toda esta problemáticas?

Mas não, a moral dos bons costumes quer escandalizar a sociedade com o "descuido" de uma mãe frente a uma performance artística.

Quer mostrar que todas as mazelas sociais, políticas e culturais que atingem centenas de crianças e adolescentes no país, pode ser resumido, em alguns momentos.

Já dizia Rubin (1998), que por mais de um século nenhuma tática para tratar da histeria erótica tem sido tão confiável quanto a proteção das crianças.

Ela ainda nos diz que essa onda contemporânea de terror erótico se aprofundou ao máximo nas áreas nas quais se faz fronteira, mesmo que apenas simbolicamente, com a sexualidade dos jovens. De certa forma, é o que estamos vivenciando nessa insana e profana “demonização” arte.

"Ingênuos" são os que compram, absorvem, internalizam e reproduzem esses discursos, que comparados a produtos de lojas de "importados", que mesmo sabendo que não possuem garantias contratuais e que são comercializados na surdina (ou não), ainda assim, acham úteis as suas vivências e experiências cotidianas.

Concordamos, inteiramente, com o lema levantado pelos conservadores, frente a histeria social, “pedofilia não é Arte”.

Nunca e jamais será. Assim como falso moralismo e hipocrisia não se constituem como dádivas de virtudes para ninguém.

RODRIGUES DE AMORIM SOUZA é gestor público e especialista em Políticas de Segurança Pública e Direitos Humanos pela UFMT.
rodriguesschneider@gmail.com


Reproduzido por: Lucas H.


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