domingo, 24 de dezembro de 2017

Adoção, uma opção pelo amor (Reprodução)

22/12/2017

“As crianças” - como carinhosamente são chamados pelo pai - Yuri, 16; Pedro, 11 e Tiago, 10, estavam no ensaio do coral de Natal do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), quando Itamar Alves Rodrigues concedeu esta entrevista, na casa onde mora com a esposa e seus quatro filhos, em Araçuaí (MG), à reportagem do O SÃO PAULO . 

Bárbara Martins Rodrigues e Itamar são casados há 25 anos e moravam na Capital Paulista até o nascimento do primeiro filho, Carl Jung Rodrigues, em 1996. “Quando ele era pequeno, percebemos que não queríamos que ele crescesse numa cidade tão grande”, disse Itamar. 

A família se mudou para o sul de Minas Gerais, mas acabou indo para o Vale do Jequitinhonha, na região Nordeste do estado, onde nasceu Bárbara. Neste meio tempo, o casal conheceu Reno Riboni e Anna Rossi, casal de italianos responsável pela Associação Comunidade Papa João XXIII, uma família espiritual composta por pessoas de diferentes idades e estados de vida. A vocação da Comunidade consiste em seguir Jesus e compartilhar diretamente a vida com os excluídos pela maioria da sociedade. 

Eles então resolveram entrar para a Comunidade e, desde então, perceberam que a vida nunca mais seria a mesma. No início, eles acolhiam temporariamente crianças e adolescentes que estavam esperando para serem reinseridos na família ou adotados. “Passaram, com certeza, mais de 15 crianças pela nossa casa e os três que adotamos são aqueles que não tinham para aonde ir”, disse Itamar.

Os membros da Associação seguem o princípio de paternidade responsável, que procura cuidar dos acolhidos e fazê-los sentir-se parte da família. Independentemente de serem filhos naturais ou não, eles devem ser amados como se tivessem que ficar para sempre no lar. No Brasil, há casas nos estados de Minas Gerais, Paraíba, Bahia e Pará, de acordo com informações do site.

Quando perguntado sobre o porquê dessa escolha pela adoção, Itamar disse que é uma opção de vida e que ele viveu exemplos próximos de adoção na família que, de alguma maneira, os inspiraram. “Minha avó adotou uma filha e também minha mãe teve uma filha adotiva, minha irmã mais nova, que mora atualmente em São Paulo”, afirmou.

Especial

O maior desafio do casal aconteceu há sete anos, quando eles receberam Yuri, o único que, legalmente, ainda não é filho de Itamar e Bárbara. Eles têm poucas informações sobre a história de Yuri, que já tinha passado por casas de outros membros da Comunidade e tem vários distúrbios psicológicos, uma deficiência mental leve e transtorno do espectro autista. “O Fórum da região nos chamou para dizer que o processo de adoção está parado e que eles não têm mais defensores públicos disponíveis. Se quisermos, devemos contratar um advogado particular. Mas nós não temos condições financeiras e nem tempo de ir várias vezes à promotoria pedir que revejam essa decisão”, explicou Itamar, que trabalha na área de Tecnologia da Informação. 

Atualmente, o casal tem a guarda ampla de Yuri, que, além do acompanhamento psiquiátrico, faz muitas outras terapias que têm ajudado enormemente no seu desenvolvimento. “O serviço de cuidar dos filhos de outras pessoas, qualquer um pode fazer. Mas nós escolhemos viver este tipo de vida”, falou Itamar, que agora está atravessando, como pai, as crises de adolescência e pré-adolescência dos filhos. 
 
Cumplicidade

O pai de Carl, que atualmente aos 21 anos está em Diamantina (MG) estudando o 3º semestre do Curso de Humanidades, disse que a acolhida de outros três filhos só foi possível devido ao forte relacionamento com a esposa. “Além de casados, nós somos amigos e temos muita cumplicidade”, disse Itamar. “Bárbara é mais equilibrada do que eu e tem muita força nos momentos mais difíceis. Mas, às vezes, sentimos que falta um pouco de espaço para nós”, continuou ele, que salientou o fato de há muitos anos não sair sozinho em companhia da esposa e que os dois aproveitam a noite, quando todos já foram dormir, para conversar entre eles. 

Bárbara e Itamar têm também uma rotina de oração, que os sustenta espiritualmente, e assumiram viver uma vida pobre e simples, em que o que conta é o essencial. “Não temos condições de acolher mais crianças até por uma questão de espaço”, contou Itamar, que falou sobre a rotina corrida de trabalho, e o acompanhamento das atividades dos filhos. “Eles fazem esporte, música e muitas outras atividades além daquelas escolares, e nós estamos sempre muito atentos para não incorrer em nenhuma injustiça, pois como eles têm temperamento totalmente diferente, às vezes, podemos nos aproximar mais daqueles que são mais carinhosos”, confessou Itamar.

No que se refere à adoção de forma mais ampla, o pai de Carl, Yuri, Pedro e Tiago disse que já tentou criar, na cidade onde mora, grupos que se simpatizam com a adoção. “Eu sei que o medo é normal em cada um de nós. O medo de se abrir ao outro, ao desconhecido. Não é simples acolher como filho alguém que você não conhece. O mais importante, a meu ver, é considerar a pessoa para além do seu passado.” 
Outro aspecto levantado por ele é o fato de as pessoas idealizarem os filhos a serem adotados. “Escolher a idade, a aparência ou até mesmo a raça é um obstáculo para os pretendentes à adoção. É natural que a gente não consiga se libertar nesse aspecto. Mas o que eu digo para as pessoas que querem adotar é que é preciso largar tudo nas mãos de Deus e confiar Nele. Na verdade, o nosso sonho é que não existissem crianças disponíveis para adoção e que todas as crianças encontrassem amparo e cuidado dentro das suas famílias”, salientou Itamar. 
 
Apoio

Sandra Maria Mahfoud Marcoccia tem 63 anos, é casada e atualmente está aposentada, depois de trabalhar muitos anos como psicóloga. Mãe do Rafael, 36; da Camila, 34, e da Karina, que foi adotada com 3 anos e hoje tem 27, ela mora em São Bernardo do Campo (SP) e contou como foi sua experiência de adoção, ligada à Comunidade que frequentava. 

“Uma vez, por meio da Comunidade, soubemos de quatro irmãos que ficaram órfãos e isso provocou em mim e no meu marido muita comoção. Foi quando começamos a pensar na possibilidade de adoção. Depois de alguns anos, conhecemos a Karina e sua situação de vida e decidimos entrar com o pedido de adoção. O processo foi longo dentro do esperado, mas não foi complicado”, contou Sandra. 

Ela explicou que a adaptação foi tranquila para todos, tanto por parte do casal como da Karina e dos irmãos. “Existia, evidentemente, uma preocupação, mas tivemos o acompanhamento de um sacerdote, de amigos, o apoio da família, uma decisão de superar os problemas que pudessem vir e, graças a Deus, foi tudo muito bom. A nossa experiência foi muito positiva.” 

Outro aspecto que Sandra ressaltou foi o apoio recebido. “Eu diria que a adoção é uma aventura que vale a pena ser vivida, mas que nunca se deve vivê-la de maneira solitária. Para nós, o fato de estarmos inseridos numa comunidade cristã foi muito importante, porque tínhamos ajuda nas dificuldades e, principalmente, porque nos lembravam o motivo maior por que fazer todas as coisas”, disse ela.


Reproduzido por: Lucas H.






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